21.9.09

"Tropa de Elite" da burguesia contra os trabalhadores e os negros

Por Guto Rivera, 9/11/07.

Gentileza: LER-QI


É impressionante como se criam "heróis" nesse país. Na verdade, poucos lugares hoje seriam mais férteis para o surgimento de um "Salvador da Pátria" do que o Brasil, que vive uma situação marcada pela frustração crescente das massas com os partidos e políticos dominantes. Nada mais trágico do que uma farsa democrática revelada como um mar de lama de corrupção e caos capitalista, desde a terra, subindo pelos morros, até os céus.

Tropa de Elite é o "filme do ano", em que José Padilha sai como grande diretor e Vagner Moura, estrelando o Capitão do Mato – quer dizer, "Capitão Nascimento" – é aclamado como o novo namoradinho do Brasil. O filme que na sua divulgação diz-se o mais realista de todos, faz na prática uma propaganda nua e crua do que os poderosos do país entendem como uma saída "possível" para a situação de calamidade pública e guerra aberta nas favelas. Propõe, na verdade, uma saída proto-fascista ao mostrar "simplesmente a visão de um policial", como diz "inocentemente" o Sr. Padilha. Apaga a vida dos jovens, negros e trabalhadores que moram lá e que "por sorte" não encontram uma dessas balas "perdidas".

Na polarização parcial que mostra, entre policiais e traficantes, o morador autêntico do morro aparece em geral como cúmplice do tráfico, e no "melhor" dos casos como um cego no meio do tiroteio, a exemplo do personagem que é ajudado pelo policial "de boa alma", um menino com deficiência visual que recebe uns óculos de presente. Será essa uma metáfora apelativa, onde os agentes do Estado querem oferecer uma "visão melhor" aos favelados? O fato é que para Padilha e seu filme, os verdadeiros heróis vestem o uniforme escuro com a caveira, adotando a tortura do "saco" para qualquer "vagabundo", que se não é do próprio movimento, é cúmplice. Na guerra particular do Capitão Nascimento não existem inocentes e o inimigo pode ser um trabalhador, negro ou pobre qualquer que saiba do paradeiro do chefe traficante. Não passa pelo filme o verdadeiro conteúdo da guerra porque não mostra o verdadeiro chefe do tráfico, aquele de paletó e gravata ou de farda condecorada financia diretamente o contrabando de armas e drogas que devem cruzar regularmente as fronteiras do país.

Mostrar que a polícia “convencional” se corrompe vendendo armas e até drogas apreendidas para os traficantes não é muita novidade. Difícil seria trazer ao conhecimento público a verdade do tráfico com a burguesia, seus representantes políticos e sua polícia, e ainda assim receber milhões e milhões para fazer um filme. É oportunista e cômodo para burguesia, seu Estado, e para a polícia – que salvaguarda seus interesses de classe – dizer que o consumo é o que faz existir o tráfico, e não mostrar que esse responde à sede de lucro fácil e a todo custo, dos mesmos capitalistas que fazem do narcotráfico uma grande empresa, ou o utilizam como um macabro caixa-dois.

Contraditoriamente, o Capitão Nascimento encarna um herói para os pais da própria classe média que vive nos condomínios cercados por morros e favelas e que temem pelos seus filhos encontrarem uma bala perdida na esquina. A solução é ficar com o filão da grana que jorra do tráfico ao passo que tenta varrer com vassouras de aço os dejetos dessa indústria ilegal. Ao se utilizar de um personagem como o André Matias, que além de policial “honesto” encarna um jovem negro, o diretor faz um apelo aos setores mais oprimidos para que “compreendam” a política repressiva do Estado. Não à-toa, já que o que se vê é que as pilhas de corpos são corpos negros, e será difícil convencer um só negro que sinta na pele o racismo da polícia!

O filme cria uma polarização entre os negros e a classe média, limpando a barra da burguesia, essa sim historicamente racista, ao não opor ambos setores aos verdadeiros “Senhores do tráfico”. Em sua manipulação consciente o filme cria uma massa crítica que deve: 1) condenar a “banda podre” da polícia; 2) condenar moralmente o uso de drogas; 3) colaborar com a política de segurança pública que “suba a favela pra deixar corpo no chão”.

No entanto, se para setores da classe média é mais fácil vender esse peixe, para a juventude, trabalhadores e negros que moram na favela é quase como pedir que assinem a própria sentença de morte. Os que vivem a experiência cotidiana das incursões policias – em especial a subida do Caveirão – à porta de suas casas, sabem que o buraco é mais embaixo, sabem que os homens de farda há tempos se tornaram os verdadeiros carrascos dos favelados. As palavras BOPE, repressão e ocupação causam muito mais terror que qualquer “chefe” ou “movimento”. Nesse sentido, o Capitão Nascimento pode virar fantasia de carnaval para gringo ver, mas parafraseando a fala do filme, os homens de preto “nunca serão” heróis do povo.

Há ainda um debate que devemos travar com os setores da classe operária e da juventude que têm assistido ao filme e passado a discutir o tema. É que para resolver a questão da violência urbana, bem como dar uma saída verdadeira à podridão dessa democracia para ricos, só mesmo confiando nas próprias forças, na organização e luta dos próprios trabalhadores. Somente organizando e mobilizando a classe trabalhadora para que lute para acabar completamente com o desemprego e para que todos tenham trabalho, para que nossos filhos tenham moradias, escolas e hospitais, poderemos pensar realmente em acabar com a violência. E isso só será possível com uma luta encarniçada contra a burguesia e suas “Tropas de Elite”.

As tropas de elite da burguesia, a exemplo do BOPE, são na verdade bandos de extermínio que atuam legalmente. Grupos estes que surgiram já na década de 50 e se proliferaram enormemente durante a ditadura militar na “caça aos comunistas”. Hoje esses grupos de operações especiais da polícia militar e civil têm como alvos do gatilho fácil os jovens e trabalhadores que moram na favela, em sua maioria negros. Amanhã servirá como órgão de repressão que esmague sistematicamente as organizações da classe operária que lutem abertamente contra os lucros dos patrões e a propriedade privada. É preciso que a vanguarda consciente dos trabalhadores defenda e eduque os mais amplos setores da necessidade de dissolver a polícia e todos os seus “grupos especiais”, que existem para defender a propriedade privada dos capitalistas e perseguir, reprimir e matar os que lutam, a classe trabalhadora e o povo pobre. Está em nossas mãos impor pela mobilização nas fábricas, nos bairros, nas ruas que a polícia desocupe nossos lares, que parem imediatamente de assassinar e torturar nossos jovens. Para defender nossa juventude trabalhadora, e os negros em particular, lutemos contra as chacinas e execuções feitas pelos policiais oficiais ou seus bandos armados, suas milícias. Esta luta deve ser combinada com a exigência aos sindicatos, centrais sindicais e partidos que dizem defender a classe trabalhadora, reivindiquem o legítimo direito de auto-defesa, começando por organizá-la. Juízo e castigo a todos os responsáveis materiais e intelectuais por esses assassinatos. Prisão e confisco dos bens de todos os políticos, empresários e policiais envolvidos nesses massacres.

A grande conclusão que devemos tirar é que, a despeito do mea culpa que diretor, atores e produtores façam, o filme BOPE é feito por encomenda de certos setores burgueses arqui-reacionários que idealizam no Capitão Nascimento o herói de uma nação dirigida por uma classe dominante falida. Tenta criar modismos por meio do carisma e personalidade marcante de seu personagem principal, interpretado por Vagner Moura, para que a massa assimile e desta forma torne banal o genocídio, a tortura e os métodos usados pelo Estado e regime burguês para resolver os problemas que ele mesmo cria como uma maquina mortífera que não cessa nunca.

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